8 de julho de 2016

ENTREVISTA: nosso blog conversou com o médico serrapretense Bruno Leite

"A má administração e o desvio de recursos penalizam muito a população carente"

O médico Bruno Leite e não esquece as raízes
Foi difícil, mas conseguimos entrevistar o cardiologista Bruno Leite, 32 anos, natural do Bravo, distrito de Serra Preta, a 170 km de Salvador. No início deste ano, entramos em contato com Bruno para saber sobre a atividade voluntária que exerce para pessoas de baixa renda em sua terra natal. Bruno nos atendeu bem, mas não desejava divulgar seu trabalho para não haver interpretação de outra natureza. “Estamos em um ano eleitoral, não queria que esse pequeno trabalho social fosse confundido com pretensões políticas”, avaliou. Médico, formado em 2008 pela UFBA, com especialização em Clínica Médica, Cardiologia e Ecocardiografia pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia-SP, convencemos o cardiologista Bruno Leite a abrir o coração e nos contar tudo. Bruno é um exemplo de dedicação e simplicidade, que com 16 anos apenas conseguiu ingressar no disputado curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia - UFBA. Além da medicina, Bruno se dedica ao atletismo, ciclismo, musculação e nas horas vagas, procura ler outros temas, que não da área médica. Vale a pena conferir!
  
Blog – Conte rapidamente sua trajetória educacional?

Fiz o primeiro grau no Bravo e o segundo em Feira de Santana. Ingressei com 16 anos na Faculdade de Medicina da UFBA em Salvador. Após concluir a graduação fui aprovado nos concursos públicos nacionais de seleção da Residência Médica, sequencialmente em Clinica Médica, Cardiologia e Ecocardiografia para me tornar especialista. Entre graduação e a conclusão das especialidades foram 12 anos (6 anos da faculdade e mais 6 anos de especialização).

Blog – Quem lhe despertou o interesse pelos estudos?
Tive ótimos professores em todas as fases de meu aprendizado e exemplos de dedicação dos amigos que saíam do Bravo para estudar - inclusive o do autor deste Blog. Apesar de meus pais não terem formação universitária (meu pai é semianalfabeto e minha mãe tem curso técnico) eles sempre estimularam e apoiaram incondicionalmente minha formação. Desde muito jovem tinha a plena convicção de que o estudo era o único caminho para melhorar a vida de minha família e isso motivou a me dedicar e sempre buscar me aperfeiçoar para ser melhor naquilo que faço.
 
Bruno Leite exercendo seu trabalho voluntário em Bravo - Serra Preta

Blog - Por que decidiu ser médico?

Decidi fazer medicina principalmente por ter em minha infância acompanhado minha mãe que trabalhava na antiga Maternidade do Bravo como Técnica de Enfermagem por 30 anos. Lá me identifiquei com o ambiente hospitalar e tive o exemplo dela que me ensinou a cuidar das pessoas com humanismo e solidariedade.

Blog – Quais os grandes desafios da carreira médica, principalmente em comunidades de baixa renda?

Um dos maiores desafios da pratica médica em comunidades de baixa renda é levar um atendimento de qualidade e com resolubilidade tendo em vista a escassez de recursos. Geralmente, conseguimos resolver muitos problemas de saúde na consulta, mas encontro dificuldades, pois o paciente não consegue ter acesso ao medicamento ou realizar um exame necessário para seu tratamento.

Blog - Por que decidiu realizar um trabalho voluntário na sua cidade de origem?

Decidi fazer esse trabalho voluntário porque apenas criticando, sem tomar nenhuma atitude para melhorar, nunca mudaremos nada nesse país. Serra Preta sempre foi um município carente em muitos aspectos e atendendo como cardiologista eu poderia dar minha contribuição para ajudar a quem precisa. Não vejo essa ação como algo de extraordinário ou digna de admiração. Estou certo que não resolverei todas as mazelas que assolam a população serrapretense, mas busco fazer minha parte com humildade e parcimônia, jamais esquecendo minhas origens.
 
Local em Bravo onde Bruno Leite se dedica voluntariamente
Blog – Boas ações devem ser divulgadas para servir de exemplo solidário, mas você gosta de realizar sua atividade altruísta silenciosamente. Algum mistério?

Por um motivo que acredito fortemente: caridade com intuito de gerar publicidade não é altruísmo e sim autopromoção e oportunismo em explorar a miséria alheia. Ainda mais porque estamos em um ano eleitoral, não queria que esse pequeno trabalho social fosse confundido com pretensões políticas.

Blog – Como é a rotina do seu trabalho solidário em Bravo?

Atendo no Bravo um dia por mês pacientes com problema cardíaco ou que sejam encaminhados por outro médico (referenciado) para o cardiologista. Utilizo o espaço na Clinica GFisio, o qual é gentilmente cedido pelo amigo fisioterapeuta Georgenes Lima. Visando manter um atendimento de qualidade similar a que faço em consultório particular, não marco muitos pacientes para assim atender com calma e atenção quem me procura.
 
Bruno atendendo seus pacientes voluntariamente
Blog – Uma consulta de um cardiologista no Brasil é muito caro e só se encontra nas grandes cidades. Como uma pessoa de baixa renda pode ter acesso a seus serviços voluntários?

Estabeleci critérios para priorizar os pacientes com problemas cardíacos de baixa renda. Para atendimento, o paciente leva o encaminhamento e preenchendo os critérios, o atendimento será marcado gratuitamente.

Blog – Como avalia a rede de saúde pública no Brasil?

A saúde é um direito de todos e um dever do Estado. A saúde pública no Brasil vai de mal a pior. A má administração e o desvio de recursos penalizam muito a população carente. A maior consequência da corrupção que assola nosso país se dá na Saúde. A falta de insumos básicos de leitos, de profissionais qualificados ceifa inúmeras vidas diariamente. O bom médico faz toda diferença, mas é ingenuidade pensar que sem a estrutura necessária se consiga oferecer um serviço digno.

Moradores procuram o serviço gratuito e de qualidade
Blog – Para os brasileiros, o coração sempre foi mais do que um órgão de bombardear sangue. A saúde no Brasil se tornou uma mercadoria ou ainda é um direito fundamental para todos?

A saúde é o nosso bem mais precioso e nunca deve ser encarada como mercadoria. Mercenários existem em todas as profissões e a imagem da medicina não pode se deixar macular por exceções. O médico deve ser valorizado como todos os demais, ainda mais quando se investiu boa parte de sua vida na formação. Algumas pessoas acham caro o preço de uma consulta ou exame, mas muitas vezes gastam bem mais em um salão de beleza ou nas festas da vida sem mostrar descontentamento.

Blog – É utopia achar que todos terão saúde de qualidade, independente de renda familiar?

Enquanto nós continuarmos a escolher mal nossos governantes e sermos tolerantes com a corrupção, nunca teremos a saúde que merecemos. Enquanto ficarmos sentados na frente do computador sendo politicamente corretos nas redes sociais sem tomar atitudes concretas para melhorar onde vivemos, nunca teremos um país melhor.





Um comentário:

  1. Está para fazer 4 anos que ele pelo telefone entendeu e orientou adequadamente minha mãe no momento que meu já estava por pouco para morrer infartado.
    Resultado: meu pai vai poder assistir mais uma Copa do Mundo.
    Meu orgulho portanto não é por ele ser meu primo e eu ter nascido aí no Bravo.

    José Raimundo Leite Figueiredo
    São Paulo-SP

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